sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Na Linha de Frente – Uma reflexão sobre o horror

É notícia na imprensa que Fortaleza é uma das cidades mais violentas do Brasil, até do mundo, e pode ter certeza que fotografar aqui é um perigo constante. Mas o que dizer dos brasileiros que fotografam os conflitos pelo mundo? Isso é o que se propõe mostrar a exposição Na Linha de Frente – Fotógrafos Brasileiros em Conflitos Armados, em cartaz no Museu Fotografia Fortaleza (MFF) até fevereiro de 2018.

A guerra é algo cruel e revela o pior do ser humano. Algo que precisa ser mostrado e debatido pela sociedade para que seja, ao máximo, evitada. É um ato de risco fotografar esses eventos e é necessário muita técnica e profissionalismo. Mas as mais de 70 obras em exposição vão além, exibem o olhar peculiar de cada jornalista.

Os retratos feitos de crianças na série Sonhos por João Castellano, por exemplo, mostram uma inquietação sobre o futuro das pessoas que vivem nas áreas de conflito. A partir da pergunta: o que você quer ser quando crescer, ele inicia a interação com as crianças que no dizer de Cristina Veit passam a ser “protagonistas e não mais vítimas” e daí surgem os retratos. São retratos de corpo inteiro, de frente, ao fundo uma parede de concreto desgastado pelo tempo. São crianças como quaisquer outras, mas vivendo uma realidade brutal. Em última análise caberá a elas no futuro decidir se permanecerão em guerra ou se optam pela paz.

Fotografias da série Sonhos, João Castellano, DIVULGAÇÃO
Também desperta admiração o trabalho de André Liohn. Ele capta as imagens tão próximas usando uma lente 28 mm e faz valer a máxima de Robert Capa “Se suas imagens não ficaram boas, é porque você não se aproximou o suficiente de seu assunto”. Algumas imagens são chocantes e desassossegam. Mas é a realidade, é o mundo em que vivemos sem desfaces. Nas palavras do próprio Liohn “o máximo que podemos fazer é registrar a guerra com honestidade, sem filtros”.

Em umas das fotos de Liohn, um pé de soldado está pisando uma poça de sangue e cartuchos de bala. Na foto O dominante e o dominado (2011) uma mão julgadora aponta pra dois homens sentados totalmente submissos. Já na fotografia Vitórias e derrotas (2011), um soldado está fazendo uma fotografia de outro que mostra o V da vitória sob um cadáver ensanguentado. É o ódio concretizado e precisa ser visto porque é uma das faces da humanidade.

O Brasil não tem muita tradição em fotografia de guerra, esse trabalho está sendo feito majoritariamente nesta última década. E é o que mostra a exposição, uma iniciativa interessante embora não se possa definir um olhar brasileiro da guerra, cada jornalista tem sua visão. E acho que é bom que seja assim. Além de Liohn e Castellano integram a exposição Gabriel Chaim, Mauricio Lima, Felipe Dana e Yan Boechat.

Acima de tudo quando vamos a uma exposição dessas precisamos aprender a ter um pouco de coragem para encarar pela frente imagens tão brutais. É papel de fotojornalistas nos apresentar tal realidade. Mas deve ser uma tarefar dura e sobre tudo complexa. Como enfrentar o medo? Como construir um olhar estético sobre o horror?

Refletir sobre o horror nos faz também lembrar a guerra camuflada em Fortaleza e do papel do fotojornalista no nosso cenário, bravos combatentes a mostrar uma violência que não pode ser esquecida, mas antes de tudo, refletida.

Enio Castelo

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