Assistindo a um desses programas de tv a cabo, numa sátira
aos ‘coachs’ de futebol americano, me deparei com um gritando “Let’s keep it
real!”. Seria ótimo se a própria realidade não fosse um valor relativo, e não
absoluto, como tendemos a acreditar.
Em matéria de história e do tempo, a verdade, como diz o
poeta, é que o futuro sempre vem. Por isso mesmo, o hoje presente e real, não
passa de um pedaço do caminho a percorrer e que está sempre em modificação.
A exposição e o excelente livro, Viva Fortaleza, Terra da Luz Editorial,
lançado recentemente é uma tentativa saudável e um exemplo do que podemos fazer
para, em termos de história, “keep it real!”.
Os organizadores do projeto, Patrícia
Veloso e Gylmar Chaves, fizeram um excelente trabalho partindo da
fotografia como base. Serviram como material, arquivos de grandes fotógrafos
cearenses e de famílias e personalidades que mantém acervos fotográficos e de
objetos da história da cidade, como os acervos da marchand D. Ignez
Fiuza e do memorialista Nirez.
Mas as fotos são o ponto de partida, um mote para pensar
Fortaleza nesses últimos 50 anos. Patrícia convidou além de fotógrafos,
intelectuais e escritores como Demitri
Túlio e Lira Neto para contar
histórias sobre a cidade e a refletir sobre a mutante Fortaleza. Propôs também
novos ensaios fotográficos e novas visões sobre o tema.
O resultado da exposição
e do livro
é um recorte de Fortaleza com a visão de várias personalidades que de certa
forma participaram ou foram testemunhas dessas mudanças. Há a tentativa de
registrar a realidade e história dessa cidade que virou uma grande metrópole
numa rapidez incomum.
É inevitável que o registro não seja só de Fortaleza, mas
das incríveis e rápidas mudanças que ocorreram na cidade nesses 50 anos. Daí a
preciosidade da publicação.
Mas mesmo que Fortaleza não mudasse tão freneticamente (e
parece que vai mudar mais ainda nos próximos anos) não conseguiríamos preservá-la
em sua inteireza e fidelidade. As mudanças, em qualquer grau de velocidade, são
inevitáveis e inexoráveis. O Louvre preservará a Mona
Lisa o máximo possível, mas um dia, como diz a profecia bíblica, tudo virará
pó. Tal qual a música cantado por Lenine, tudo é, no final, areia.
Entretanto podemos fazer algo que vá além da matéria e do
real. Cultivar seu valor cultural. Que já não está mais na esfera do tangível,
mas da consciência e, mais ainda, da consciência coletiva.
É isso que o livro Viva
Fortaleza faz – aliás, o livro é a segunda etapa do projeto "Memórias
da Cidade" que já tem publicado o livro Ah!
Fortaleza. Cultivar e fomentar a
reflexão sobre a Cidade. Uma cidade tão veloz em suas mudanças que chega a ser
difícil apontar uma identidade para ela. Alguém já disse que a mudança
constante é a própria identidade de Fortaleza.
Fotógrafos como Gentil Barreira e Nelson
Bezerra, só para citar alguns, desempenharam e desempenham até hoje um
trabalho que além da estética e do óbvio registro, realiza uma função social e documental
da história da cidade. Seu material e acervos são mais importantes ainda pelo
fato da constante e veloz transformação dos espaços e da cultura da capital. O livro,
apesar de não ter sido feito com o propósito paradidático, é indispensável às
atuais e futuras gerações na construção desta nossa “realidade” e deveria ser
necessariamente acessível às escolas e universidades.
(...)
Não, não é pra sempre. Nada é para sempre. Tudo está em
transição e transformação e não conseguiremos congelar o passado como se
imagina (erradamente) possa ser a função dos museus. Mas podemos sim, e deveríamos
sempre, pensar a história e criar diálogos entre o passado que não existe mais no
“real” (mas existe através da memória), e o presente que estamos construindo
agora.
Não sei se surgirá um futuro melhor (não há certezas
absolutas também), mas provavelmente um futuro mais consciente, mais participativo
da sociedade e mais seguro no que pretendemos construir como “realidade”.
Cito um excelente trabalho precedente a este, um pouco
diferente é verdade, mas que serve como referência e que hoje tem um valor
inestimável: o acervo de Marc Ferrez (1843
- 1923). Hoje sob curadoria do IMS – Instituto
Moreira Salles.
Ferrez ainda no tempo de
uma fotografia incipiente documentou o Brasil e em especial o Rio de Janeiro
de forma pioneira. O resultado belíssimo das imagens transcende o aspecto
estético evidente, para ser, além de belo, registro documental. Um registro
histórico de valor cultural incalculável.
São documentos-imagens de uma época que não ficou congelada
na história, mas está registrada pela visão e esforço de um artista e
documentarista precursor no que fez e modelo para os fotógrafos atuais e
futuros. Seu trabalho hoje dá subsidio para as transformações que o Rio de
Janeiro passará para sediar a Capa do Mundo de 2014 e
as Olimpíadas de
2016.
Pode-se assim, contribuir e ser agente consciente em termos
histórico e cultural nas transformações sobre a realidade. Publicações como Viva
Fortaleza são instrumentos (no Ceará, instrumentos raros e preciosos) para
esse exercício de consciência na transformação inexorável da realidade e na tentativa
de na medida do que for possível: “Keep it Real!”
SERVIÇO:
A partir de 06 de dezembro de 2011.
(85) 3261.0525, 8814.4593
Enio Castelo
Fortaleza – CE, janeiro de 2012.
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Capa do Livro "Viva Fortaleza", Terra da Luz Editorial (Divulgação) |
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Foto de Maurício Albano para a publicação "Viva Fortaleza" (Divulgação) |
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Duas imagens de Fortaleza em épocas diferentes (Divulgação ) fonte: http://vivafortaleza.blogspot.com |
Foto de Nelson F Bezerra (Divulgação) |
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