O fotógrafo,
o “fazedor de imagens”, é parte ativa na
formação do inconsciente imaginético dos lugares e dos símbolos de uma
população, ou estes lugares e símbolos se impõe por si só com a inerente força
do que representam?
Sem querer tecer maiores considerações (que deixo para outro
texto) acredito na primeira hipótese. O “registrador de imagens”, aquele que
capta, seleciona e dá seu ponto de vista sobre os lugares e símbolos de um povo
e de uma região tem uma responsabilidade sobremaneira na imagem que se forma
inconscientemente no povo sobre esses mesmos lugares e símbolos.
Nesta semana tive a chance de ver a Exposição “Postais
do Ceará”, que se encontra em cartaz no MIS
- Museu da Imagem e do Som do Ceará, realizada pelo Ifoto – Instituto da
Fotografia e que já passou pelo Centro
Cultural dos Correios em Fortaleza e tem a curadoria de Silas de Paula e Tiago Santana. Nota-se
pelas imagens expostas que os fotógrafos que participaram da mostra parecem bem
conscientes de sua utilidade, importância e influência nesta chamada ‘Visão’
que se têm do Ceará através do registro de seus símbolos e lugares.
A maioria das imagens parece superar o cartão postal
convencional, sem perder a condição de tal. Não vendem apenas uma beleza
estereotipada e dirigida para um turismo banal. Há opinião mesmo buscando a
beleza e a divulgação do Ceará.
A imagem que mais me impressionou foi a de Henrique Torres: o portal de
entrada do Theatro
José de Alencar visto pela perspectiva de um espelho quebrado. Como se
fosse uma obra de Picasso,
a fachada do teatro ficou toda fragmentada na imagem. O símbolo maior da
cultura do Ceará recortado e distorcido como um mosaico numa incerteza e numa
multiplicação de possibilidades.
A partir dali compreendi a exposição. Tal grupo de
fotógrafos não quer apenas ‘vender’ o Ceará para o turista (eles querem isso
também). Mas querem mostrar nossa terra de um ponto de vista inteligente e
crítico.
Em outra foto (por Marcelo
Isola) uma jangada, o mar e a duna. Nada mais normal para um cartão postal
do Ceará. O detalhe é que estão dispostos numa geometria que faz referência
direta ao concretismo
e neoconcretismo,
movimentos artísticos importantíssimos no Brasil do Século XX. Além de evocar
as obras de Sérvulo
Esmeraldo, um dos mais importantes artistas plásticos cearenses. A imagem
fez de um ícone do Ceará (a jangada, o mar e duna) uma obra concreta via a
possibilidade da fotografia. É o diálogo do cartão postal com a importância e
liberdade autoral das artes plásticas (só ratifica que fotografia
também é artes plásticas).
Já Fernando Jorge,
ao mostrar um pescador apoiado no mastro ‘derriado’ de sua jangada contemplando
as ‘Velas do Mucuripe’ também ‘derriadas’ como se refletisse sobre essa
atividade artesanal que lhe dá sustento e suas possiblidades no futuro, nos põe
a pensar a mesma questão como se o problema fosse também nosso (e é mesmo). Não
são só as ‘Velas do Mucuripe’, é também o porquê das ‘Velas...’
Alex Costa
mostra um ‘gaiato’ (símbolo do peculiar humor cearense) fazendo graça defronte
a Catedral Metropolitana e tem as torres a lhe servir de chifres parodiando o
corno, essa fonte inesgotável de gozação pelas ruas da cidade.
A fotógrafa Bia
Fiuza capta um jumentinho percorrendo uma faixa de areia próxima ao mar e
um homem a observá-lo. É uma clara referência aos camelos e dromedários do
deserto do Saara, tão populares. O jumento é nosso camelo e a aridez de nossa
terra é quase tão quão um deserto. Nada mais pertinente, nada mais referente ao
turismo do Norte da África. Porque não damos a mesma importância ao jumento
como é dada ao camelo? Porque queremos esconder que parte da nossa população
vive como num deserto?
Como pode ser literalmente visto, há um grupo muito
competente de fotógrafos no Ceará, dos quais estes que compõe a exposição “Postais
do Ceará”, é uma amostra muito bem selecionada, que está consciente de seu
papel como parte ativa (como bem diz o pesquisador e fotógrafo Silas de Paula no
texto curadorial) na formação da imagem do Ceará no inconsciente coletivo. E
diante disto, exercita e executa seu olhar não apenas para ‘turista ver’, mas
para todos nós pensarmos.
É a fotografia com consciência e opinião, que quer também
registrar a imagem do Ceará de forma positiva, mas não se submetem a
pasteurização de seu trabalho e à ‘imagem fácil’. Eles trabalham com força, e mesmo com
coragem, registrando os lugares e símbolos de nossa terra usando não só a
beleza como arma, mas a reflexão crítica.
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Folder da Exposição "Postais do Ceará" com a fotografia de Marcelo Isola fonte: http://baiaoilustrado.tumblr.com |
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Fotografia de Carlos Gibaja fonte: http://www.fotoclubef508.com/2010/12/exposicao-postais-do-ceara/ |
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Fotografia de José Albano fonte: http://www.saraivaconteudo.com.br/Noticias/Post/40836 |
Fotografia de Celso Oliveira fonte: http://fecop.seplag.ce.gov.br/noticias/exposicao-201cpostais-do-ceara201d-chega-ao-centro/ |
Realização:
Curadoria
Fotógrafos
Alex
Costa, Ângela
Moraes, Bia Fiuza, Carlos Gibaja, Celso
Oliveira, Chico
Gomes, Clesivaldo
Alves, Fátima Perini, Fernanda
Oliveira, Fernando Jorge, Henrique Torres, José
Albano, José
Wagner, Lia de Paula, Marcelo Isola, Marcos Guilherme, Marcus
Vale, Maurício
Albano, Otávio Nogueira, Sheila Oliveira.
Serviço:
Entrada franca.
85 3101 1207.
85 3101 1207.
Fortaleza – CE, março de 2012.